Apesar da economia do País estar ainda ameaçando um início de recuperação, a situação não foi a mesma para o transporte de grãos, com a supersafra que, literalmente “salvou a lavoura” dos autônomos e frotistas, ao menos nos dois primeiros meses de 2017
Por Erik Valeriano
O transporte rodoviário de cargas foi um dos setores mais afetados pela crise econômica que atingiu o Brasil nos últimos dois anos. O colapso que fechou transportadoras e tirou autônomos do mercado, começou a dar sinais de melhora no início deste ano, com a confirmação da supersafra de grãos. Segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas, a colheita de soja – que é a primeira do ciclo – deve ter aumento superior a 13% em relação ao ano passado. A expectativa é que até o final da colheita, a produção passe das 108 milhões de toneladas.
O fato é que a supersafra, incluindo outros tipos de grãos, tem exigido mais caminhões em operação e valorizado o frete. De acordo com a ATC – Associação dos Transportadores de Carga do Mato Grosso, o preço do frete subiu, em média, 30% durante esta safra, em relação ao mesmo período no ano passado.
Os meses de janeiro e fevereiro, picos da colheita, foram os melhores para o setor. O aquecimento do mercado congestionou as estradas na região Sul de Mato Grosso. Em Rondonópolis (220 km de Cuiabá), a concessionária Rota do Oeste, que administra 850 km da BR-163 em Mato Grosso, informou que no primeiro bimestre de 2017, mais de 30 mil caminhões por dia passaram pela estrada, que liga o norte e o sul do Brasil.
O alívio do início de 2017 foi fundamental para a sobrevivência de quem trabalha como autônomo. O paranaense Diego Godoy, 34 anos de idade, viaja há mais de 10 anos puxando frete para todas regiões do País, conta que o transporte de grãos de Mato Grosso para os portos do Sul e Sudeste tiverem acréscimo superior a 20%. Disse que o crescimento contribuiu para melhorar o seu rendimento mensal, que chegou a ser de R$ 6.000,00. Mesmo assim, esse valor está defasado, disse Godoy, pois é muito pouco. “Aí você tem que fazer investimentos futuros no caminhão e não vai sobrar nada. Mesmo assim, classifico essa situação como positiva porque antes não sobrava nada”, destacou.
O catarinense Célio Zílio argumentou que a crise dos últimos anos endividou os motoristas e mesmo com o período positivo parte do dinheiro levantado com frete já tem destino certo: as dívidas contraídas no ano passado. “Hoje, de cada R$ 100, 00 que se ganha no frete, sobram apenas R$ 30, 00 para o motorista. Isso com frete bom e além disso não sabemos como vai ficar os próximos meses. Tudo vai depender da economia e das próximas safras”, salientou.
Já o carreteiro Rogério Oliveira Viana, do interior paulista, que transporta cargas de Mato Grosso para São Paulo, destacou que com o fim da safra de soja, alguns embarcadores já estão baixando os valores do frete. “Em alguns lugares que no começo da safra pagavam até R$ 125,00 a tonelada, hoje pagam R$ 100,00, mas ainda está melhor que no ano passado, quando o valor máximo alcançado foi de R$ 90,00 a tonelada. Essa inconstância me deixa preocupado, mas ao contrário de outros anos estou mais esperançoso”, concluiu.
O motorista Ederson Antunes Rosa, da cidade de Sinop, Região Norte de Mato Grosso, também já sentiu a retração no valor do frete. No trecho de Nova Mutum para Rondonópolis, os preços praticados até a última semana de março eram de R$ 80, 00 a tonelada frente, contra R$ 110 pagos até o início da fevereiro. Acrescentou que mesmo assim o fluxo é bom e acaba equiparando. Segundo ele, a produtividade poderia ser uma das melhores dos últimos anos se os agendamentos fossem mais rápidos.
O carreteiro afirma que tem condições, mesmo com horário de descanso e tudo, de melhorar seu rendimento em até 30%. O problema. afirma, são os agendamentos, pois tem motorista que aguarda até uma semana para viajar. “Para quem vem de uma crise severa isso atrapalha muito e gera prejuízo”, Ederson disse, ainda, que para frotistas e autônomos o ano de 2017 depende e muito de uma nova supersafra, esperada para a colheita do milho, em agosto.
A estimativa para a duas safras do ano, segundo o IBGE, é de 88,4 milhões de grãos. O aumento deve chegar a 40% em relação a 2016. “Se acontecer realmente uma grande safra de milho – e tiver exportação – vamos ter muito frete para o segundo semestre. Nesta situação teremos um grande ano. Caso contrário, voltaremos ao mesmo patamar do ano passado”, concluiu o carreteiro.
Para o diretor da ATC, e empresário do setor de transportes, Adelino Bissoni, parte das previsões para o setor foram confirmadas. A supersafra produziu mais oxigênio para o segmento, pelo menos momentaneamente. “Essa melhora ajudou e muito. No segundo semestre do ano passado, teve quebra de safra, sobrou caminhão no mercado e faltou mercadoria. Mas os primeiros dois meses de colheita em 2017 equacionaram o problema. Os fretes voltaram para um patamar razoável”, explicou.
O transportador enfatiza que o momento é positivo, mas ainda não é possível afirmar que o primeiro semestre deste ano está salvo. A instabilidade econômica, migração excessiva de caminhões para agronegócio e burocracia podem atrapalhar. Ele lembra que a retomada da economia ainda não se confirmou. Ainda existem receios.
“Com isso, o agronegócio sofreu uma invasão de veículos que trabalhavam em outros setores. Tem caminhão de tudo quanto é lugar e segmento puxando grão no Mato Grosso”, afirmou. Acrescentou que o agendamento e a troca de notas também são motivos de preocupação. “Uma viagem curta, que poderia ser executada num dia, dura três. Isso quebra produtividade do veículo”, explicou.
De acordo com Bissoni, muitas empresas ainda aguardam uma resposta maior do setor para colocar 100% da frota em operação. Todo mundo está trabalhando com cautela. “É difícil achar quem colocou todos os carros para trabalhar”, reforçou. Ele disse que o bom início de ano ainda não deu o retorno necessário para colocar toda a frota na estrada. É preciso esperar. Se o valor do frete cair 15%, por exemplo, muita gente vai encostar os caminhões que geram mais custos”, conta.
Fonte: O Carreteiro